Fechados x Lapinha da Serra
Cordilheira do Espinhaço, MG
6 dias - mai/2022

Diário

20/05 - 21/05) Rio de Janeiro → BH → Sete Lagoas → Fechados

Ônibus da Viação Sete Lagoano se preparando para fazer o trecho Belo Horizonte → Sete Lagoas
Ônibus da Viação Sete Lagoano se preparando para fazer o trecho Belo Horizonte → Sete Lagoas

Embarcamos pouco antes das 23h da sexta-feira, após alguns percalços com o trânsito confuso na chegada à rodoviária do Rio, e a fila de acesso à plataforma de embarque. Optamos por viajar de ônibus leito, que se mostrou uma excelente alternativa para garantir um sono tranquilo até Belo Horizonte. Chegamos no horário previsto, em torno das 6 da manhã do sábado. Tivemos tempo de fazer o café da manhã com calma na rodoviária da capital mineira, antes da partida para nossa próxima escala, às 8h. Com mais 1 hora e 20 minutos de viagem, chegávamos à Sete Lagoas. Assim que desembarcamos, não demorou para o Farias encostar com sua Doblô verde. Contratamos seu serviço para nos conduzir até nosso destino final daquele sábado: o arraial de Fechados. Às 9:40, estávamos deixando Sete Lagoas.

Doblô do Farias na entrada da Pousada Águas do Cipó após encarar os 40 Km de estrada de terra
Doblô do Farias na entrada da Pousada Águas do Cipó após encarar os 40 Km de estrada de terra

Fazia um frio fora do normal para aquela época do ano. Segundo o telejornal, teria feito 8°C em Belo Horizonte no dia anterior. Farias no contou que naquela manhã, teria feito 4°C em Sete Lagos. Às 11 da manhã o asfalto ficou para trás, quando acessamos a estrada de terra que marca os 40 Km finais até Fechados. Foram mais 1 hora e 15 minutos de viagem até a Pousada Águas do Cipó. Fomos recepcionados pelo simpático Henrique, montanhista também, que nos contou sobre suas andanças por aquelas bandas. O espaço da pousada impressiona, com bastante área verde, piscina e brinquedos para as crianças. Nos instalamos e logo fomos fazer nosso almoço, na própria pousada. Comida boa, mas bem simples e pouco variada para o que se poderia esperar olhando para a estrutura da local. Circulando pelo refeitório, alguns cães ansiosos por alguma sobra. Dentre eles, um super peludo, parecia carregar em si metade da poeira do arraial. Um outro, chamava atenção por estar mancando, como se a sua pata dianteira esquerda estivesse quebrada.

A Igreja no "centro" de Fechados.
A Igreja no "centro" de Fechados.
Foto: Alexandre Ciancio

Fizemos um rápido tour pelo arraial. O vilarejo tem praticamente uma única rua, com uma igreja, um colégio. Ao fundo, a parede de montanhas do Espinhaço, nos instigando. Retornamos para a pousada. Reparamos que dois cães, incluindo o da pata machucada, pareciam ter nos adotado, insistindo em permanecer na porta do nosso quarto. Colocamos as mochilas em ordem para a caminhada do dia seguinte, e tivemos bastante tempo para relaxar. Jantamos também na pousada, até porque Fechados não ofereceria outra opção. Dentre os pratos do jantar, lasanha e pizza congelada. Os cães sempre nos seguindo e, naturalmente, atentos a qualquer oportunidade que pudesse aparecer na mesa do jantar. O da pata quebrada não desperdiçou a sorte de se deliciar com a embalagem da lasanha congelada, assim que teve chance. Não poderíamos supor que essa não seria a última noite que passaríamos com companhia canina.

22/05) Fechados → casa abandonada

A minúscula Fechados vai sendo deixada pra trás a medida que ganhamos altitude na serra.
A minúscula Fechados vai sendo deixada pra trás a medida que ganhamos altitude na serra.

Pela manhã soprava o vento constante e gelado que marcaria presença nos finais de tarde e manhãs de toda a travessia. Sabíamos que teríamos um dia curto de caminhada, então não tivemos pressa para acordar e aproveitar o café da manhã da pousada. Café sem grande luxo, mas com alguns toques locais como pão de queijo e o queimadinho (leite com açúcar caramelizado). Deixamos nosso quarto, e os cães, que na porta já nos esperavam, começaram a uivar sem parar, anunciando nossa partida. Nos despedimos do Henrique e tomamos uma trilha aparentemente recente, bem na frente da pousada para cortar alguns metros de estrada, e já nos colocar na trilha principal, rumo às Cachoeiras do Horizonte e Cobú.

A linda Cachoeira do Horizonte.
A linda Cachoeira do Horizonte.
Foto: Alexandre Ciancio

Notamos que os dois cães nos seguiam pelo caminho e tentamos desencorajá-los com gritos e até arremessando alguns objetos na sua direção. Sabíamos que a viagem seria longa, e não seria nada prudente que os animais nos seguissem, principalmente um deles estando machucado. Eles insistiam, então imaginamos que a trilha até as cachoeiras fizessem parte das suas rotinas, e tão logo começássemos a nos afastar do seu território, retornariam pelo mesmo caminho que vieram. A trilha vai rapidamente ganhando altitude, a medida que negocia seus quase 600 metros de ganho de elevação pelo enorme paredão de pedra às margens do povoado. A topologia e o estilo da trilha me lembraram o início da travessia da Chapada Diamantina de 2019, no Beco do Guiné.

Cachoeira do Canyon
Cachoeira do Canyon

As partes mais interessantes desse dia certamente foram o visual de Fechados, ficando para trás conforme avançamos pela montanha, e as cachoeiras. As duas principais são a do Horizonte e a Cobú, e ambas valem a visita, mas a do Horizonte, pela sua formação de "piscina com borda infinita", é a mais bonita. No meio da manhã o sol do outono ainda não era capaz de aquecer o seu poço, ainda assim não deixamos de dar um mergulho. Água tão gelada que não possibilitava a permanência por mais de alguns minutos, sem que a musculatura começasse a dar sinais de câimbras. Já na Cachoeira do Cobú, relaxamos um pouco aproveitando a paisagem, mas havíamos nos desencorajado para um segundo banho.

A casa abandonada em frente ao nosso primeiro acampamento
A casa abandonada em frente ao nosso primeiro acampamento
Foto: Alexandre Ciancio

Seguimos viagem abrindo e fechando porteiras, até pararmos novamente para um banho no topo da Cachoeira do Canyon, já nas imediações do ponto onde havíamos planejado fazer nosso primeiro pernoite. Com apenas 6 Km de caminhada, seria uma parada prematura para uma viagem tão longa, porém, o próximo ponto confiável de água ficaria somente a 12 Km dali. Logo após o Canyon, chegamos a buscar por uma terceira cachoeira que ficaria nas proximidades, mas não tivemos sucesso. Vasculhamos o terreno bastante irregular, em busca de um local minimamente aceitável para nossa barraca. Decidimos subir um morrote no outro lado do rio. Nos deparamos com uma casa abandonada e um gramado bastante razoável à sua frente. Negociamos um espaço entre as incontáveis pilhas de estrume de vacas e instalamos nossa residência para aquela noite.

Pôr-do-sol no primeiro acampamento.
Pôr-do-sol no primeiro acampamento.
Foto: Alexandre Ciancio

Ali, já estávamos numa área razoavelmente isolada, e os dois cães começaram a se tornar uma verdadeira preocupação. Àquela altura já haviam sido batizados: Lasanha, em homenagem ao seu bote no jantar anterior, e Queimadinho, em homenagem à bebida local, de cor semelhante ao seu pelo. Conforme a noite se aproximou, vimos ao longe as luzes da casa do Valtinho, uma das últimas residências antes de mergulharmos definitivamente no Espinhaço. Nossa última esperança era que no dia seguinte a trilha continuasse até próximo da casa, e os animais ficassem por lá. Preparamos nosso jantar tentando nos proteger do vento gelado. O topo dessa colina nos proporcionou a noite com menor sensação térmica da excursão, e também com o céu mais bonito. Foram 360° de estrelas, sem nuvens, sem a competição com o brilho da Lua. Conseguimos ver simultaneamente o Escorpião nascendo no leste, enquanto Órion morria no oeste, o Cruzeiro no sul e até a Ursa Maior no norte. Essa noite estrelada está entre os momentos mais marcantes dessa bela travessia.

23/05) Casa abandonada → Córrego Andrequiçé

Deixando o acampamento "casa abandonada". O ponto elevado nos possibilitou o melhor visual das estrelas.
Deixando o acampamento "casa abandonada". O ponto elevado nos possibilitou o melhor visual das estrelas.
Foto: Alexandre Ciancio

Nos abrigamos entre as moitas, num declive do terreno, para nos proteger um pouco do vento enquanto preparávamos o nosso primeiro café da manhã da travessia. Lasanha já estava de pé e nos seguiu, certamente já na expectativa de conseguir um desjejum. Habilidosamente, amassou o capinzal alto, criando para si uma toca confortável, e abrigada do vento. Não permaneceu ali por muito tempo. Tão logo o cheiro da comida começou a se espalhar, veio pro nosso lado reivindicar uma porção. Tentamos afastá-lo da cozinha, e ele nos deu uma mostra do seu temperamento difícil, exibindo seus dentes trincados. Era a primeira vez que nós andávamos por aquelas terras. Não sabíamos que tipo de imprevisto poderia nos aguardar pela frente. Em excursões longas, cada grama de bagagem é cuidadosamente avaliada, e o mesmo ocorre para a alimentação. Ninguém estava preparado para alimentar dois intrusos. Não cedemos à sua provocação.

O Cocho Azul.
O Cocho Azul.
Foto: Alexandre Ciancio

Desmontamos acampamento e pouco depois das 8:15 estávamos partindo. Imitando a manhã anterior, quando deixamos a pousada, os animais começaram a uivar como se fôssemos uma matilha de lobos partindo para a caça. Ou como se estivéssemos em alguma carava de filme de velho oeste. Aparentemente, eles não estavam pensando em desistir da viagem. De fato, assim que partimos a trilha começou a se desviar da casa do Valtinho, e nossa ingênua esperança de que os cães ficariam por lá, rapidamente foi deixada para trás.

No primeiro dia já havíamos vencido o trecho mais íngreme da subida da serra, mas continuamos ganhando altitude durante a maior parte do segundo dia. Nos primeiros 4 Km de caminhada, alcançamos a cota de 1340 metros de altitude, e nos próximos quase 5 Km, fomos gradualmente subindo até os 1410 metros. Passamos pelo "Cocho Azul", um ponto marcado em um dos tracklogs que estudamos como referência, e não fazíamos ideia de como seria na realidade. E lá estava ele, bem em destaque na paisagem. Um bebedouro plástico para o gado, que talvez não chamasse tanta atenção, mas é engraçado o processo de conhecer pessoalmente aquelas referências que durante meses víamos apenas plotadas num mapa.

Lasanha (à direita) e Queimadinho (camuflado na mata à esquerda) no ponto mais elevado do dia.
Lasanha (à direita) e Queimadinho (camuflado na mata à esquerda) no ponto mais elevado do dia.

O céu estava limpíssimo e esse dia de caminhada passou por belos campos abertos, nos oferecendo vistas profundas, com montanhas longe no horizonte. Nos últimos 2 Km a subida sessou, e conhecemos pessoalmente o trecho que aparecia no mapa como "Subida do Miltinho", e para o nosso sentido de navegação foi na verdade a "Descida do Miltinho". Perdemos 300 metros de altitude descendo pela crista estreita de um grande afloramento rochoso, uma topografia bem interessante, e certamente uma subida bastante desgastante para aqueles que fazem a travessia no sentido contrário.

Uma das quedas da Cachoeira da Samambaia, com excelente poço para banho
Uma das quedas da Cachoeira da Samambaia, com excelente poço para banho
Foto: Alexandre Ciancio

Alcançamos o Córrego Andrequiçé às 12:40, temperatura agradável de 22°C. Um bom lugar para acampar: O córrego era mais volumoso do que esperávamos e no local havia algumas árvores esparsas fornecendo alguma sombra. Como pontos negativos, a presença de muitos mosquitos, e o terreno bastante irregular, repleto de esterco. Montamos a barraca e partimos para a exploração da Cachoeira da Samambaia. Identificamos um trecho em que conseguiríamos atravessar o curso d'água por cima de algumas pedras, e nos pusemos a procurar a trilha para a cachoeira na outra margem. Trilha não muito clara, mas em poucos minutos estávamos avistando a queda d'água. A Cachoeira é linda, desce pela encosta de forma irregular, formando diferentes poços e quedas, com bastante vegetação e água claríssima. Encontramos um belo ponto para banho e, como já havíamos deixado o acampamento montado, pudemos nos refrescar e descansar naquele lugar incrível, sem nenhuma pressa.

Mais uma bela noite de observação de estrelas no Córrego Andrequiçé
Mais uma bela noite de observação de estrelas no Córrego Andrequiçé
Foto: Alexandre Ciancio

Lasanha e Queimadinho não se animaram para o banho, mas encontraram um ponto ensolarado nas pedras, onde dormiram tranquilamente. Após algum tempo relaxando, decidimos retornar. Nos vestimos e recolhemos nossas coisas, começamos a descida e logo notamos que os cães não nos acompanharam. Com o cansaço e o intenso barulho da queda d'água, não perceberam nossa movimentação. Estávamos tentando manter um distanciamento no nosso relacionamento com os dois intrusos. Mas deixá-los pra trás naquele lugar não seria legal. Retornamos um pouco e chamamos pelos dois, que despertaram e começaram a descer em nossa direção. A descida pelas pedras entretanto não era fácil, principalmente para o Lasanha, que ainda mancava. Tivemos que ir até eles e orientá-los para que encontrassem o melhor caminho. Pela primeira vez, nos vimos ativamente auxiliando os dois para vencer aquele desafio junto conosco.

Tivemos mais uma noite fria e repleta de estrelas. A contemplação no acampamento anterior, num ponto sobrelevado, não pôde ser superada. Ainda assim, o céu daquela noite estava também memorável. Observamos o Escorpião e Sagitário se erguerem no leste, e nos recolhemos para a barraca. No dia seguinte, encararíamos um dos trechos mais longos da travessia.

24/05) Córrego Andrequiçé → Cachoeira Carapinas

Acordamos às 6 e demos início aos ritos matinais. Os cães dormem não muito longe da barraca, deitados enrolados em depressões circulares rasas no terreno, que eles cuidadosamente cavam para si ao final da tarde. Pela manhã, ainda estão sonolentos, mas com a movimentação do café da manhã, se espreguiçam e começam a nos circular na expectativa de alguma comida. Queimadinho é muito mais dócil e não causa problemas. Lasanha, mais uma vez, apela para o confronto e tenta nos intimidar mostrando seus dentes trincados. Se na tarde anterior a compaixão com bichos nos motivou a ajudá-los no retorno da cachoeira, o risco de tomar uma mordida num lugar ermo, enquanto tentamos tomar nosso café da manhã, nos deixa irritados com situação. Seguimos viagem.

Caranguejeira atravessa a trilha
Caranguejeira atravessa a trilha
Foto: Alexandre Ciancio

Começamos acompanhando o córrego Andrequiçé. O atravessamos em um ponto mais à frente, diferente do que havíamos usado para acessar a cachoeira. Depois, seguimos em paralelo ao Rio Preto, até alcançarmos a primeira subida do dia, depois de meia hora de caminhada. Nesse local, nos deparamos com uma grande caranguejeira atravessando a trilha. Não foi o primeiro, nem o último aracnídeo que encontraríamos na excursão. Na manhã anterior, evitamos um acidente desagradável com um escorpião amarelo. O bicho havia se escondido dentro de um chapéu!

Escorpião amarelo encontrado dentro do chapéu no acampamento da casa abandonada
Escorpião amarelo encontrado dentro do chapéu no acampamento da casa abandonada
Foto: Alexandre Ciancio

Com uma hora e vinte de percurso, alcançamos o ponto de cruzamento do Rio Preto. Esse foi o cruzamento mais delicado da excursão, e deve dar dor de cabeça nos períodos mais chuvosos. Iniciamos buscando um ponto de passagem pela esquerda, mas o rio ficava mais volumoso, e a presença de um afluente acabaria forçando não a uma, mais a duas travessias. À direita não há nenhuma passagem evidente, e a proximidade de uma queda d'água torna a alternativa bem pouco atraente. Optamos por atravessar na direção da trilha, aproveitando um afloramento rochoso que se projeta para fora do rio naquele ponto. São pontas de pedra inclinadas e bastante irregulares, mas com a ajuda dos bastões de caminhada fomos conseguindo encontrar uma forma de negociar nossa passagem.

Cruzando o Rio Preto aproveitando o proeminente afloramento rochoso
Cruzando o Rio Preto aproveitando o proeminente afloramento rochoso
Foto: Alexandre Ciancio

Mais tarde, passamos pela entrada da Fazenda Pinhões da Serra, onde pensávamos ser possível conseguir algo que pudesse ser dado de alimento para os cães, mas não encontramos ninguém no local. Alguns quilômetros depois, alcançamos a casa da Dona Cacilda e Seu Batu, onde também não encontramos ninguém. Ao longo dos dias fomos notando os cães tentando caçar. Geralmente o Queimadinho se enfiava no meio da vegetação, atento, como se seguisse o seu olfato, ou algum ruído. De repente, começava a se aproximar furtivamente de algum ponto promissor. Daí surgia o Lasanha em disparada, sem nenhuma elegância, latindo sem parar e frustrando qualquer possibilidade de sucesso. Aparentemente o Lasanha queria ser o líder, mas na falta da habilidade necessária, e ainda machucado, não se conformava com a iniciativa do amigo, só lhe restando atrapalhar toda a missão. Talvez tenha sido nesse dia que reparei o Queimadinho fazendo cocô na mata. Apesar de não estarem conseguindo caçar nada, pela cor das fezes via-se que certamente estavam se alimentando de vegetação.

Queimadinho observa o rebanho
Queimadinho observa o rebanho

Além de caçador, descobrimos também que o Queimadinho seria um excelente cão de pastoreio. Não podia ver qualquer bovino, que partia para o cerco. Nesse dia cruzamos um pasto, os bois e vacas nos avistaram à distância e começaram a vir em nossa direção. Certamente não nos fariam mal algum, deviam pensar que éramos cuidadores. De qualquer forma, um rebanho vindo em nossa direção não é algo muito confortável para quem não está acostumado com a situação. Sem preocupações, no entanto, para quem anda com Queimadinho. Corajoso, não lhe importava a quantidade ou tamanho dos animais. Corria sem parar em torno do rebanho. A julgar pela energia gasta, alguém diria que o cão estava super bem alimentado. Aos poucos o gado estava todo reunido num agrupamento compacto, como se o cachorro houvesse sido treinado há anos para tal função.

A subida para o Campo Quadrado
A subida para o Campo Quadrado
Foto: Alexandre Ciancio

Passamos também por uma curiosa pedreira, onde parecia ter havido exploração de algum minério, no meio do nada. Atravessamos uma voçoroca e partimos para a última subida do dia, muita bonita por sinal, que nos levou a um local identificado em um tracklog pelo nome de Campo Quadrado. Essa travessia é marcada por belos visuais 360°, e esse ponto é icônico nesse aspecto. A partir dali, iniciamos uma forte descida em direção à Cachoeira Carapinas. Em certo momento, começamos avistar uma casa grande mais abaixo, com um homem cultivando uma pequena horta. A casa aparentava ser nova. Inclusive, não estava registrada nos tracklogs, nem tinha sido registrada nas imagens de satélite. Ao nos aproximarmos puxamos assunto com o homem. Muito simpático, se apresentou como Dico, confirmou se tratar de uma construção ainda em andamento, parte do seu projeto de abrir um negócio ali, envolvendo restaurante, talvez hospedagem. Conseguimos com ele algumas bananas que já serviram como algum alento para os cães.

O Campo Quadrado
O Campo Quadrado

Finalizamos a descida encontrando o córrego Carapinas, ponto planejado para nosso terceiro pernoite. Foram 17,6 Km de caminhada e nos momentos finais o cansaço já estava se apresentando. Montamos nosso acampamento numa encosta na outra margem do rio. Ele é bem raso ali, não oferecendo dificuldades para ser ultrapassado. A cachoeira Carapinas não fica visível de imediato, é necessário seguir o curso do rio por alguns metros para avistá-la. Cachoeira bonita, mas a descida para a base não estava evidente, e com o sol já caindo atrás da montanha que havíamos acabado de descer, preferimos tomar o banho na parte superior. Lá em cima, a água congelante, combinada com o rio raso e com muito limo, não facilitaram o banho. Ao menos, conseguimos ainda nos valer dos últimos raios de sol daquele longo dia para nos aquecer.

A Cachoeira Carapinas
A Cachoeira Carapinas
Foto: Alexandre Ciancio

Estávamos esticando as roupas para secar após o banho quando nos tocamos que havíamos cometido, no mínimo, uma grande deselegância. Após aquela conversa bastante amistosa com Dico, nos sentimos mais à vontade na área. Quando encontramos o córrego, nos animamos com a finalização do dia de caminhada e fomos imediatamente procurar um local para acampar. Não demos conta que não estávamos mais na propriedade do Dico, e sim, no terreno da Dona Geralda, que possui uma casa no alto da encosta onde montamos a barraca. Dali a pouco, desceu a encosta um homem para falar conosco. Descobrimos ser o filho da Dona Geralda. Muito atencioso, se mostrou preocupado em passarmos frio ali na parte baixa e nos convidou para montar o acampamento próximo da casa. Pedimos mil desculpas pela nossa entrada desajeitada, mas já havíamos nos instalado ali e preferimos ficar.

Registramos 9°C no início da noite, temperatura mais baixa do que nos acampamentos anteriores, porém, com menos vento, o frio nos incomodou menos. Pra mim, o maior incômodo foi por outro motivo: Desde a noite anterior estava sentindo coceiras estranhas. Nessa noite minha suspeita se confirmou: Consegui localizar e matar alguns dos carrapatos que haviam se instalado no meu corpo. Infelizmente, muito estrago já tinha sido feito e as coceiras continuariam me perseguindo no restante da travessia. Só foram dar trégua quando apelei para o anti histamínico oral, já que nem o tópico estava dando conta.

25/05) Cachoeira Carapinas → Rio das Pedras

Neblina na aproximação ao Parque Estadual da Serra do Intendente
Neblina na aproximação ao Parque Estadual da Serra do Intendente

Pela primeira vez acordamos com a barraca molhada do sereno e alguma garoa noturna. Nos apressamos para desmontar o acampamento durante uma trégua, mas sabíamos que a chuva voltaria muito em breve. Iniciamos a caminhada já com anorak e capa de chuva das mochilas a postos. Teríamos um longo dia de caminhada pela frente, novamente com mais de 17Km de percurso, e com 900 metros de ganho de elevação. Subimos a encosta, passamos ao lado da casa da Dona Geralda, nos despedimos do filho dela e tomamos a trilha de subida da serra, deixando para trás o acesso à Extrema. Não demorou muito para que a chuva fina, o vento e a neblina começassem a nos acompanhar. Chegamos a andar um bom pedaço com chuva e vento, até eu me animar a tirar o anorak quando estávamos numa estradinha de terra batida bem simpática, com vegetação mais densa do que o padrão dessa travessia. Porém, conforme a estrada foi ganhando a altitude e deixando a mata, a neblina e o vento voltaram a atrapalhar.

Queimadinho enfrenta o boi bravo no Parque Estadual
Queimadinho enfrenta o boi bravo no Parque Estadual
Foto: Alexandre Ciancio

Alcançamos o Parque Estadual da Serra do Intendente após 2 horas de caminhada. A topografia parecia oferecer vistas incríveis da região, mas com a neblina, mal conseguíamos enxergar uma centena de metros à nossa frente. O vento soprava contra nosso sentido e chegava a atrapalhar nosso deslocamento. Caminhamos ainda por mais uma hora através do parque para que, enfim, pudéssemos ter uma pequena mostra do lindo visual ao nosso redor. Lamentamos ter cruzado esse trecho com tão pouca visibilidade. Alguns minutos depois, paramos um pouco para comer, e para eu proteger uma parte do pé que reclamava da fricção com bota. Na trilha, bem à nossa frente, alguns cavalos nos observavam. Apesar de estarmos dentro de uma unidade de conservação, não faltavam bois e cavalos por ali. Muitos animais bastante fracos inclusive, aparentando estar abandonados. Dali a pouco, um pequeno rebanho começou a vir em nossa direção. Mais uma vez, Queimadinho colocou ordem nos bois e cavalos, liberando a trilha para nossa passagem.

Aproveitando uma trégua do tempo na saída do Parque Estadual da Serra do Intendente
Aproveitando uma trégua do tempo na saída do Parque Estadual da Serra do Intendente
Foto: Alexandre Ciancio

Seguimos viagem com o tempo um pouco mais favorável. A chuva, a neblina e o vento deram uma trégua. Temperatura em torno dos 15°C. Próximo do meio dia, cruzamos as ruínas de uma antiga ponte. Muitas nuvens ainda no céu, mas já conseguíamos contemplar um pouco mais do visual das montanhas. E que visual! Dali pra frente começamos realizar uma longa e suave descida com visuais sensacionais ao nosso redor. Agora, as nuvens ajudavam a compor um horizonte ainda mais fantástico. Alcançamos uma enorme voçoroca, e percorremos ao seu lado os 400 metros de trilha finais até chegarmos no Rio das Pedras, onde montamos nosso quarto acampamento. O rio é raso, com fluxo de água lento e alguns poços pequenos com água esverdeada, repleta de girinos. Não foi possível tomar banho, mas a água para o pernoite estava garantida.

À espera da chuva no acampamento Rio das Pedras
À espera da chuva no acampamento Rio das Pedras
Foto: Alexandre Ciancio

Observamos no céu uma nuvem escura distante e começamos a especular se o vento traria aquela chuva em nossa direção. A ameaça parecia que não iria se concretizar. Conseguimos fazer nosso jantar sem problemas. Fomos dormir sem contemplação de estrelas pois o tempo permanecia instável. Durante a madrugada, acordei com muita coceira por conta dos carrapatos, e chovia bastante. A chuva parece ter durado toda a madrugada. Estávamos pensando como os cães estariam se virando lá fora. Em determinado momento, acordamos com o barulho dos bichos passando por baixo da lona da barraca, pra se proteger no avanço.

26/05) Rio das Pedras → topo Bicame

Acordamos ainda com um pouco de chuva mas, ao sairmos da barraca, ela nos deu uma trégua. Fizemos o café da manhã e partimos para a caminhada. Ainda receosos com o tempo, mantivemos os anoraks à mão. Felizmente, ao longo dia, não tivemos mais chuva. Observaríamos o céu mudar de stratus para alto stratus e, no final do dia, se apresentaram as primeiras cirrus stratus da travessia. Havíamos vencido dois longos dias de caminhada seguidos e esse, ao contrario, seria bastante curto. Percorremos quase 6 Km basicamente acompanhando o Rio das Pedras, até as imediações da Cachoeira Bicame, na parte alta do rio. Chegamos lá em torno das 10 da manhã. Preferimos deixar as cargueiras escondidas em uma moita próxima ao rio e imediatamente seguir a trilha para conhecer a cachoeira mais famosa do percurso.

A enorme voçoroca nas proximidades do Rio das Pedras vai sendo deixada para trás
A enorme voçoroca nas proximidades do Rio das Pedras vai sendo deixada para trás
Foto: Alexandre Ciancio

Ainda na parte alta, chegamos até um ponto bem próximo da queda d'água, onde o visual já é encantador. Descemos um trecho íngreme da trilha para alcançar o seu poço. Lá em baixo, encontramos a vista "do cartão postal" da cachoeira. O poço é bem grande e, ao fundo, a água despenca por diversas cascatas emoldurada pelas paredes de pedra. Todas as cachoeiras que conhecemos nos dias anteriores tiveram seu charme todo especial. Mas certamente a Bicame vence com folga no critério da imponência. Tivemos tempo de sobra para admirar aquele local incrível, e até arriscar um nado naquelas águas gélidas. Retornamos ao topo, e percorremos a trilha de volta até as mochilas.

Não foi fácil localizar um ponto razoável para a barraca. No fim, até conseguimos um espaço bem plano, mas o solo rochoso dificultou bastante a montagem. Tivemos que buscar diversas pedras para amarrar os cordeletes, já que era impossível fincar os espeques no chão. Tivemos uma tarde bastante tranquila e contemplativa. Em torno das 16h, resolvemos caminhar novamente até a cachoeira para tirar mais fotos com o Sol em outra posição. Lasanha preferiu ficar no acampamento. Já Queimadinho, mesmo com as costelas evidentes sob a pele, julgou que ainda tinha energia para nos acompanhar.

A Cachoeira Bicame
A Cachoeira Bicame
Foto: Alexandre Ciancio

Descemos até o poço pela segunda vez, e enquanto tirávamos algumas fotos, perdemos Queimadinho de vista. Procuramos nos arredores e achamos que ele teria resolvido antecipar a volta pro acampamento. Subimos toda a pirambeira tentando localizá-lo do alto, mas não tivemos nenhum sinal dele. Teria ele voltado realmente, ou estaria perdido lá embaixo ainda? Antes de fazermos toda a trilha de volta à barraca, para só então descobrir que o bicho tinha ficado pra trás, decidimos descer até o poço, pela terceira vez, e procurá-lo melhor... Definitivamente o cãozinho já havia nos cativado... Rodamos a área por todos os lados, encontramos até uma pegada na areia, parecida com a de algum felino. Teria Queimadinho virado comida de onça? A busca não dava resultados, e só nos restou subir até o topo novamente e retornar até o acampamento. Conforme nos aproximamos da barraca, veio ele, latindo, correndo, balançando o rabo, para nos receber. Incrível o vínculo que esses animais conseguem criar.

Pôr do sol no último acampamento da travessia
Pôr do sol no último acampamento da travessia
Foto: Alexandre Ciancio

Com a proximidade do final da travessia, nosso controle com a alimentação começou a se flexibilizar, levemente. Na noite anterior os animais haviam ganhado uma fatia de provolone cada. Hoje, conseguiram até algumas rodelas de salame. Sorte deles que um dos nossos amigos de caminhada costuma andar com uma quantidade de comida generosa. Naturalmente, essas pequenas porções não eram suficientes para repor o enorme gasto energético dos dois. Estavam visivelmente mais magros do que alguns dias atrás. Apesar disso, a pata do Lasanha parecia estar se recuperando. Antes, dava a impressão de estar quebrada. Agora, um olhar mais atento era necessário para se perceber que, volta e meia, ele ainda dava algumas mancadas. Falando em mancada, Lasanha ainda iria nos dar mais uma mostra do seu mau comportamento...

Escorpião amarelo na nossa cozinha na última noite de travessia
Escorpião amarelo na nossa cozinha na última noite de travessia
Foto: Alexandre Ciancio

Curtimos um lindo pôr do sol, jantamos na habitual friaca e, já no escuro, começamos a colocar os equipamentos em ordem para dormir. Nas pedras onde montamos nossa "cozinha" encontramos mais um escorpião! Nos recolhemos. Os cães já estavam enrolados nos seus cantinhos desde o cair da noite. No meio da madrugada, sou acordado pelo meu amigo: "Os bichos estão revirando o lixo!". De imediato não sabia exatamente qual lixo e quais bichos seriam, mas logo tudo se explicou. Cometemos o erro básico de deixar lixo não supervisionado... Nenhum animal silvestre se aproximou, mas sim, o Lasanha. No meio da madrugada a fome deve ter apertado, e ele atacou os sacos de lixo que ficaram fora da barraca. Sobrou para meu amigo enfrentar o frio para recolher toda a bagunça no meio da madrugada.

27/05) Topo Bicame → Lapinha da Serra

Nossa última manhã de acampamento na travessia
Nossa última manhã de acampamento na travessia
Foto: Alexandre Ciancio

Depois de um dia bem tranquilo, quase 15 Km de caminhada nos aguardavam em nosso último dia de travessia. Naquela manhã nossa rotina foi um pouco mais conturbada do que o habitual. O solo ali era bastante raso e pedregoso. O intemperismo garantiu a formação de uma areia extremamento fina, quase como uma farinha de trigo. Além da dificuldade de montagem da barraca, não tivemos maiores problemas com isso no dia anterior. Naquela manhã, entretanto, o vento decidiu soprar com força nos dando um banho de areia. Os grãos facilmente passavam através das telas da barraca, transformando todo o equipamento em bife à milanesa. Sendo nosso último pernoite na travessia, as consequências não seriam graves. Mas, infelizmente, uma das portas da barraca acabou sofrendo um dano permanente... Os grãos de areia danificaram o funcionamento do zipper. Não houve limpeza que o restaurasse.

Sempre Vivas a caminho de Lapinha da Serra
Sempre Vivas a caminho de Lapinha da Serra

Às 8:30 partimos. Depois de ter descido a pirambeira até o poço da cachoeira tantas vezes no dia anterior, acabamos fazendo o mesmo percurso de forma automática. Apenas quando chegamos lá em baixo, nos demos conta de que, dessa vez, talvez tivesse sido melhor cruzar o rio ainda na parte superior. Apesar de não existir nenhum cruzamento óbvio, possivelmente existiria uma forma de atravessá-lo pulando de pedra em pedra. Porém, uma vez lá embaixo, ninguém queria subir novamente com as cargueiras. Então o jeito foi descalçar as botas e fazer a travessia por dentro da água mesmo. Se o rio estivesse mais cheio, possivelmente teríamos preferido retornar e realizar a passagem lá em cima.

Lasanha e Queimadinho matam a sede na chegada à Lapinha da Serra.
Lasanha e Queimadinho matam a sede na chegada à Lapinha da Serra.

Os quilômetros iniciais foram muito agradáveis, com a Bicame ficando para trás, um belo visual das montanhas ao redor, e vários campos de sempre vivas. Depois, alcançamos a estrada de terra. Aí, foram quase 10 quilômetros de muita paciência até Lapinha da Serra. Apesar da temperatura não estar tão alta, a caminhada na estrada, embaixo do sol, estava cobrando seu preço. Quase chegando na cidade, Lasanha e Queimadinho não pensaram duas vezes antes de saciar a sede em uma cisterna aberta dentro de uma propriedade à beira da estrada. Às 12:50, passávamos por baixo do pórtico de boas vindas à Lapinha da Serra. Foi emocionante chegar àquela simpática cidade, depois dos 6 dias de experiências incríveis no Espinhaço. E também estávamos felizes a aliviados de ver os dois cães completando esse enorme desafio de resistência. Foi um grande aprendizado os dias com esses animais. É admirável como são resilientes e companheiros.

Queimadinho curte um pouco de descanso e piscina após 6 dias de travessia no Espinhaço
Queimadinho curte um pouco de descanso e piscina após 6 dias de travessia no Espinhaço

Com 1 Km e pouco a mais de caminhada, chegávamos no portão da Pousada Lapralapa. Não sabíamos exatamente como seria dali pra frente com os cães montanhistas. Não dava para falar pra eles: "Muito bem, vocês não foram convidados para a excursão, mas conseguiram chegar até aqui por teimosia. Meus parabéns! Agora, sigam as suas vidas em Lapinha da Serra". Os animais, por outro lado, pareciam saber muito bem o que queriam. Mal tocávamos a campainha, Lasanha e Queimadinho já pulavam o muro para dentro da Pousada! A funcionária que vinha nos receber tomou um susto com a invasão, e nos perguntou se os cães eram nossos. Bem, tivemos que contar nossa longa história. Para a sorte dos dois, a pousada aceitava animais. E não adiantaria queremos nos iludir com a possibilidade de que eles se manteriam do lado de fora. O jeito foi "fazer o check-in" dos intrometidos.

Queimadinho e Lasanha ganham almoço na pracinha de Lapinha da Serra
Queimadinho e Lasanha ganham almoço na pracinha de Lapinha da Serra

Enquanto preenchíamos nossos dados, tomávamos nossa cervejinha comemorativa. Os cães ganharam ovos frescos. Depois, beberam uma boa dose de água da piscina e relaxaram no deque de madeira. Hilário ver os dois folgados curtindo a maior mordomia, depois do sufoco no cerrado. Saímos para o almoço, mas antes, fomos concretizar os planos sobre o qual falamos diversas vezes ao longo dessa caminhada: Comprar ração para nossos amigos caninos. Que alívio foi ver aqueles dois finalmente sendo alimentados decentemente! Comemoram uma boa porção na praça, enquanto nós também almoçávamos. O banquete chamou a atenção dos demais habitantes caninos de Lapinha da Serra, e teve que ser suspenso para evitar conflitos. Foi retomado de volta na pousada. Colocamos uma porção para cada um num canto. Lasanha com seu comportamento dominador, tentava comer sempre do mesmo monte onde o Queimadinho ia. Uma cena ridícula, onde nenhum dos dois conseguia comer em paz, Em fim, se alimentaram até se fartar. Naquela noite dormiram em caixas de papelão que organizamos na varanda. Finalmente protegidos do vento, da chuva e do frio.

28/05 - 29/05) Lapinha da Serra → Belo Horizonte → Rio

Na nossa última manhã em Minas, fizemos um excelente café da manhã na pousada. Relaxamos e saímos para almoçar antes de partir. Os cães nos seguindo pelo vilarejo. Queimadinho já começava a obedecer alguns comandos, o que era ótimo para evitar que invadisse os estabelecimentos por onde passávamos. Lasanha possivelmente também já entendia a comunicação, mas preferia solenemente nos ignorar. Mais independente, já havia se enturmado com alguns cachorros da praça. Durante o almoço, o perdemos de vista. Retornamos para a pousada, pegamos nossas bagagens e logo encostou o táxi que contratamos para nos levar até Santana do Riacho. Chegou então o momento inevitável. Embarcamos com nossas mochilas e o carro partiu. Olhamos pelo vidro traseiro e, em meio a poeira da estrada, vimos o Queimadinho correndo atrás do nosso carro. A moça da pousada tentava chamá-lo de volta. Cena triste.

Sinto saudades deles, em especial do Queimadinho. Muito inteligente, dócil, e ao mesmo tempo corajoso. Seria um excelente cãozinho para se adotar.

Durante nossa curta estadia em Lapinha, tentamos convencer uma pessoa ou outra a ficar com eles, mas não tivemos sucesso até nossa saída. Fico curioso para saber o destino dos dois. Teriam passado a morar na pousada? Estão tendo uma vida mais tranquila na turística Lapinha, do que na minúscula Fechados? Ou será que partiram para algum outro povoado, na cola de outro grupo de viajantes?

Ponto de embarque em Santana do Riacho
Ponto de embarque em Santana do Riacho

Em Santana do Riacho tivemos que aguardar um pouco até a saída atrasada do nosso ônibus para Belo Horizonte. O trajeto da tradicional Saritur vai parando em cada curva da estrada até chegar no destino. Chegamos às 19:20 na rodoviária de Belo Horizonte, após uma viagem de 4 horas. Mas ainda tínhamos bastante tempo até nossa saída para Rio, que seria apenas às 23h. Aproveitamos para visitar o Savassi, onde jantamos excepcionalmente bem no restaurante Gennaro. Mais tarde, embarcamos sem problemas para o Rio. Assim como na viagem de ida, conseguimos dormir muito bem na viagem noturna de ônibus leito. De manhã cedo estávamos de volta ao Rio de Janeiro a às nossas rotinas. Cheios de lembranças maravilhosas dessa excursão encantadora, emblemática, e também inusitada, ao coração do Espinhaço.

Por: Ângelo Vimeney
Publicado em: 18/12/2022

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